A legitimidade é um daqueles conceitos que circula em nossas veias desde o nascimento. Mais do que um acaso, é um processo de organização de sistemas de dominação e criadora de hierarquias. É com a Legitimação que se consegue a estabilidade de relacionamentos de autoridade, a solidez do cotidiano e a assunção de regras, normas e leis que planejam, organizam e permitem a execução de nossas vidas sociais e políticas.
A Legitimidade é um “semideus” da vida social. Nas religiões, nas escolas, nas famílias, no trabalho... em tudo há a legitimidade coo o bilhete de acesso ao mundo. Ou se aceitam as coisas que estão a nos envolver ou a recriamos em todo patamar. Não há saída: um processo de legitimidade só pode ser substituído por outro processo de legitimidade. Ele sempre estará lá. É um pressuposto da vida.
Todos os que exercem o poder desejam perceber sua posição como “legítima” e sua superioridade como “merecida”. Aos subordinados deve pulsar o sentimento de “destino justo e inevitável”. Com a crença na legitimidade [trigo], de forma combinada com a cultura política, se produz a servilidade e a docilidade [pães]. A legitimidade, como tantos outros elementos imateriais e indiscretos da vida, é alimento para fortalecer os processos políticos e sociais de uma sociedade qualquer.
Max Weber [Maximilian Karl Emil Weber, 1864-1920], sociólogo alemão fundador da Sociologia, considerava três “Tipos Ideais” de Legitimidade. A primeira delas baseada na Autoridade Racional-Legal. Funda-se na crença de que regulamentos e sistema jurídico são, antes de tudo, legítimos e devem ser aceitos. No tempo em que vivemos parte do Direito está sob suspeita. Haveria preferências humanas e orientação a necessidades de grupos específicos. A força da legitimidade não pode residir em humanos, pois estaria sempre antes e acima dos “homens”. Como resultado há insatisfação, incertezas, desafios e riscos frente aos resultados das determinações legais. Se o Juiz é precursor e a Lei é meio, os elementos de causa-efeito ficam invertidos. Por outro lado, para alguns grupos, causar incertezas e desconfiança é a arma secreta par envolver “seguidores” na tragédia política e social. Enquanto se enfileiram em “barricadas”, os “líderes” passeiam e zombam. A incerteza é o que fere a legitimidade.
O segundo “Tipo Ideal” de Legitimidade é nomeada como Autoridade Tradicional. Repousa sobre a crença de que as tradições são os fundamentos da organização da vida e da aceitação da hierarquia. Está na memória seletiva de arranjos de sucessos que se ajustam aos interesses sociais e políticos atuais. Quando o presente está sob suspeita e o futuro é um caminho inseguro aos interesses de grupos específicos, em geral se recorre ao passado e à tradição política para se manter no poder. Nos tempos políticos atuais, perdemos de vista os representantes de Autoridade Tradicional.
A Autoridade Carismática é a terceira versão da Legitimidade que se caracteriza pela devoção a alguém excepcional, herói, de caráter extraordinário que atrai a aceitação das normas ordenadas por ele. A Legitimidade aqui deverá sempre se preocupar em diferenciar o particular-privado do público-coletivo, uma vez que ao confundir interesses pessoais com legitimidade para representar seus “devotos” perderá a áurea protetiva da legitimidade.
O Brasil passa por tempos difíceis que exige governos de transição. É muitíssimo provável que estaremos a abrir as janelas para os dias seguintes em busca de qualquer tipo de legitimidade. Até lá haverá um governo de múltiplas faces políticas, coloração cinzenta, com o Congresso Nacional tradicionalmente fisiológico e patrimonialista e a “oposição” na soleira a procurar as fraquezas governamentais.
O Brasil tem na Ordem a transição, e no Progresso o labirinto até a Legitimidade.