Coluna Exitus na Política
Por Sérgio Saturnino Januário - pesquisa@exituscp.com.br
A água que afoga
A modernização do Estado brasileiro ocorreu quando conseguimos alcançar estabilidade econômica [Plano Real] e estabilidade política [Lei de Responsabilidade Fiscal e Reeleição]. Antes de 1995 o Brasil recorria a cortar zeros das referências nominais da moeda e a criar Planos Econômicos de destinos curtos [Plano Cruzado, 1986; Plano Bresser, 1987; Plano Verão, 1989; Plano Collor, 1990]. Todos os Planos Econômicos eram firmados em congelamento ou controle de preços e da inflação, congelamento de salários, evaporação de zeros, rebatismo da moeda e gambiarras no câmbio. Ficava de fora o controle dos gastos públicos, condição dos buracos nas contas públicas e aumento das dívidas dos governos. Chegamos ao ponto de dar um calote no FMI. Tempos difíceis!
Era comum um governante iniciar uma grande obra [elefantes brancos] e deixar a dívida [rombos] para o governo seguinte. Era corriqueiro um governante contrair empréstimos de bancos públicos [geralmente sob seu controle] para rolar e enrolar as contas de hoje, já que os tributos não conseguiriam saldar todas as contas e sonhos dormidos em lençóis eleitorais.
A partir de 1995 os Bancos Estaduais passam a ser privatizados e em 2000 foi sancionada a Lei de Responsabilidade Fiscal [Lei Complementar n. 101]. Os bancos estatais porque serviam de armas para assaltos, e a LRF para punir os assaltantes. Controlar os apetites político-eleitorais e o uso de recursos e meios públicos para interesses pessoais eram as causas que provocavam um novo tempo. Desde então o dinheiro não mudou de nome, a inflação não subira, tabelas de controle de preço de produtos e serviços sumiram. E passamos a reivindicar gestores, políticos capacitados, Estado de Direito.
Leis e Instituições foram criadas para fiscalizar a gestão governamental e dar senso coletivo ao que nasce como imposto para todos [da União aos Municípios]. Os gastos estatais ficaram condicionados à capacidade de arrecadação de tributos [capacidade de endividamento], submetidos a sistemas de controle público sobre as atividades governamentais [Ministério Público com seus braços de estivador] e a exigências institucionais de transparência. Mas.... Passado algum tempo....
Foge-nos à memória o tempo da inflação anual de 10% ou mais. Visitam-nos os formatos de “orçamentos públicos secretos”, sem transparência. Forjam-se leis para que o controle dos recursos públicos seja separado da capacidade de arrecadação de tributos: “furar” o teto. Faz-se a demagogia populista de usos de recursos públicos para fins eleitorais, aos moldes dos empréstimos de governadores em bancos estaduais: “cavar” o fundo do poço.
Já experimentamos os problemas do descontrole do orçamento público e o populismo eleitoral, e desaprendemos a fazer “ranchos” como defesa da inflação. Já não sabemos o sentido do Overnight, e deixamos de falar em “gatilhos” salariais. Os sistemas de controle sobre o governo, as práticas personalistas de demagogia eleitoral, a mitomania de todos os dias [compulsão por mentir] nos afundam na falta de esperança.
Governantes [do Poder Legislativo e Executivo] que se interessam sempre por eleições, que desprezam as pessoas e suas fomes, que comercializam o eleitor, que fabricam leis e arranjos como prolongamento dos braços, mãos e bolsos são, na política, o mal que a água faz para quem se afoga.