Colunas


Decisão arriscada


Com muito custo, inclusive a vida de inúmeras pessoas que morreram lutando contra a ditadura militar, a sociedade brasileira finalmente conseguiu promulgar a Carta Republicana de 1988, que no seu capítulo reservado aos direitos fundamentais, estabeleceu no seu artigo 5º, inciso LVII, que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, sendo que pela sua importância, a chamada presunção de inocência foi elevada à condição de cláusula pétrea pelo nosso Texto Magno, não podendo ser alvo de modificação pelos nossos legisladores (art. 60, § 4º, da CF).

Tal garantia veio a acompanhar o disposto em vários diplomas internacionais - dentre os quais a Convenção Americana de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário (art. 8.2) -, evitando assim que um cidadão seja submetido a uma reprimenda penal sem que tenha a sua culpa definitivamente formada através de uma decisão judicial terminativa. Trata-se, portanto, de uma importantíssima conquista de toda sociedade, protegendo as pessoas contra eventuais abusos ou erros praticados pelo Estado na persecução penal.

Neste cenário, data maxima venia, é preocupante a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal no HC 126.292/SP, mudando o seu entendimento então consolidado desde 2009, para agora possibilitar a execução provisória de uma sentença criminal antes do encerramento do processo, bastando apenas a sua confirmação pelo segundo grau de jurisdição, ainda que pendentes recursos aos Tribunais Superiores.

Afinal, sob o pretexto de se estar atendendo um reclamo da sociedade, o STF acabou conspurcando a literal redação do acima citado dispositivo magno, estabelecendo a ilógica premissa de que uma pessoa é presumidamente inocente somente até o julgamento em segunda instância, muito embora a nossa Constituição Federal seja clara em assentar a necessidade do trânsito em julgado da sentença condenatória.

A questão se torna ainda mais alarmante quando se verifica que aproximadamente um terço das decisões confirmadas em segundo grau acabam sendo reformadas no STJ ou no STF, criando assim o descabido risco de pessoas inocentes terem de iniciar o cumprimento da sua pena, inclusive indo parar injustamente na cadeia, para depois restarem absolvidas junto às Cortes Superiores.

Quem irá, nestes casos, reparar estes danos incomensuráveis à honra e a dignidade destes cidadãos colocados injustamente no cárcere, sobretudo quando o próprio STF já reconheceu em duas oportunidades recentes - ADPF 347 e RE 592.581 – a completa falência do sistema carcerário brasileiro?

Por óbvio, a OAB/SC respeita a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Mas espera que a nossa Excelsa Corte reveja com urgência esta guinada no seu entendimento, que esvazia o modelo garantista inspirador da nossa Constituição Federal, a fim de não imolarmos uma das mais importantes conquistas do Estado Democrático de Direito Brasileiro. Caso contrário, infelizmente, não poderemos mais chamar a nossa Lei Máxima de “Carta Cidadã”.

Paulo Marcondes Brincas - Presidente da OAB/SC


Conteúdo Patrocinado


Comentários:

Deixe um comentário:

Somente usuários cadastrados podem postar comentários.

Para fazer seu cadastro, clique aqui.

Se você já é cadastrado, faça login para comentar.

ENQUETE

A Câmara de Itajaí deve ter mais vereadores?



Hoje nas bancas

Confira a capa de hoje
Folheie o jornal aqui ❯


Especiais

STF rejeita marco temporal, mas lei segue com riscos a direitos indígenas

Vitória parcial

STF rejeita marco temporal, mas lei segue com riscos a direitos indígenas

Júlio Lancellotti é calado nas redes enquanto padres conservadores discursam para milhões

IGREJA CATÓLICA

Júlio Lancellotti é calado nas redes enquanto padres conservadores discursam para milhões

Governo consegue aprovar Plano Clima após diluir responsabilidade do agro

PLANO CLIMA

Governo consegue aprovar Plano Clima após diluir responsabilidade do agro

Três meses após sanção da Lei Felca pais não sabem proteger filhos na web

Controle parental

Três meses após sanção da Lei Felca pais não sabem proteger filhos na web

Empresas de festas visam adolescentes e marketing predatório aposta até em porta de escola

NA PORTA DA ESCOLA

Empresas de festas visam adolescentes e marketing predatório aposta até em porta de escola



Colunistas

O silêncio do luto nas festas de fim de ano

Ideal Mente

O silêncio do luto nas festas de fim de ano

O desafio do Fórum Parlamentar Catarinense– foto principal

Coluna Acontece SC

O desafio do Fórum Parlamentar Catarinense– foto principal

Jogo sujo, risco real: bets ilegais pressionam o mercado e o Fisco observa o apostador

Direito em movimento: esporte, jogos e entretenimento

Jogo sujo, risco real: bets ilegais pressionam o mercado e o Fisco observa o apostador

Sorrisos pra coluna

JotaCê

Sorrisos pra coluna

Auxílio-acidente e aposentadoria antecipada: o benefício antigo que pode mudar seu direito hoje

Direito na mão

Auxílio-acidente e aposentadoria antecipada: o benefício antigo que pode mudar seu direito hoje




Blogs

Festas de fim de ano com saúde sempre 😃

Espaço Saúde

Festas de fim de ano com saúde sempre 😃

Exclusivo: Governador Jorginho quer Osmar deputado estadual

Blog do JC

Exclusivo: Governador Jorginho quer Osmar deputado estadual

Somos testemunhas da história

Blog do Magru

Somos testemunhas da história

Geografia do Afeto — quando o sentir também é território

VersoLuz

Geografia do Afeto — quando o sentir também é território






Jornal Diarinho ©2025 - Todos os direitos reservados.