Diz aí, Gabriel Sylvestre!

"Não tem a possibilidade de a Wolbachia sair do corpo dos mosquitos"

Gabriel Sylvestre, gerente de implantação do método Wolbachia, conversou com a jornalista Fran Marcon e Lúcio Vieira, graduado em Ciências Biológicas, para explicar a nova ferramenta de combate à dengue

(FOTOS: FRAN MARCON )
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O que é o método Wolbachia?

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Gabriel: Surge como uma ideia diferente: a gente solta mosquito. Em 1920, foi descoberta a Wolbachia, uma bactéria comum na natureza, em mais de 60% dos insetos. Baratas ...

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Gabriel: Surge como uma ideia diferente: a gente solta mosquito. Em 1920, foi descoberta a Wolbachia, uma bactéria comum na natureza, em mais de 60% dos insetos. Baratas, mariposas, borboletas, abelhas e formigas, outros muitos mosquitos têm Wolbachia. Foi descoberto que na mosca, aquela que fica na fruteira em casa, tem Wolbachia. Foi visto que a mosca com Wolbachia, não se infectava com o vírus. Só que mosca não pica ninguém. Um grupo de pesquisa lá na Austrália tirou a Wolbachia de dentro da drosophila [mosca-da-fruta] e [transferiu] através de injeções para ovos de mosquitos. Foram quatro anos de estudo para conseguir um mosquito aedes aegypti, que é o vetor de dengue, de zika, chikungunya, nascendo com Wolbachia.

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Quais são os fatores positivos e negativos da implantação desse controle?

Gabriel: Quando a gente começou o processo no Brasil em 2011/2012, a coisa já estava acontecendo na Austrália, na Indonésia e no Vietnã. Isso tem acontecido no mundo todo, não é só Brasil. Hoje a gente está em 11 cidades no Brasil. Tem mais de cinco milhões de pessoas contempladas. Um exemplo: a gente vai começar agora Balneário Camboriú, vamos imaginar que daqui a pouco Itajaí também. A gente não chega em uma cidade e apenas solta mosquito. São três a quatro meses antes apenas comunicando. Leva-se informação. A gente treinou todas as unidades de saúde dos bairros contemplados. A ideia é que a população conheça e, mais do que isso, a gente faz pesquisa de opinião ainda. A gente sabe que a desinformação tem um poder destrutivo muito grande. A gente não quer que as pessoas tenham medo. [Por que o nome Wolbachia?] O sobrenome do inventor. Ele foi homenageado pela descoberta que aconteceu lá em 1924, se eu não me engano. Por conta do nome se nomeou uma espécie: wolbachia pipientis, que é uma espécie de bactéria.

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"A desinformação tem um efeito, no final, que são pessoas adoecendo e morrendo"

 

Qual é a eficiência desse método em comparação com aqueles que a gente usa atualmente?

Gabriel: A gente tende a não fazer comparação porque são complementares. O método Wolbachia, ele não acaba com mosquito. Ele não trabalha com eliminação do vetor. [O que é eliminação do vetor?] É inseticida, é raquete elétrica, é tela impregnada, é inseticida por UBV, que é o fumacê. Isso tudo é supressão e ainda precisa ser feito. A outra parte é substituição, que é o que o método Wolbachia faz. A população não tem que mudar o hábito dela porque a Wolbachia chegou. Ela tem que seguir matando o mosquito. Não vai atrapalhar. Se tiver menos mosquitos, é menos vetor. A única coisa que pedimos: a gente não pode estar com o carro liberando mosquitos na frente e um fumacê atrás. O mosquito vai morrer igual a outro. O método não vai funcionar.

 

Como os mosquitos com Wolbachia são liberados no ambiente?

Gabriel: Um carro da prefeitura, que é a nossa parceira operacional – todo o pessoal que cria mosquito, que solta mosquito, que monitora, são servidores públicos das prefeituras. Essa é a contrapartida que os municípios trazem para esse projeto pra aplicação do método. Um carro já conhecido, vai ter uma pessoa dirigindo o veículo, bem devagarzinho, 20 km/h, para o mosquito conseguir sair e voar. Se estiver muito rapidão, o vento pode atrapalhar. Um carro com uma pessoa sentada atrás com caixas de potes de mosquito, liberando pela janela. São liberações em vias públicas. A população não vai sentir aquela nuvem de mosquito. O mosquito vai se espalhar e vai colonizar aquele ambiente de uma forma natural.

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" A desinformação tem um efeito, no final, que são pessoas adoecendo e morrendo"

 

Quanto tempo para esse mosquito que foi solto nas ruas gerar frutos? Quantos insetos são previstos para serem soltos em Balneário Camboriú?

Gabriel: A gente está com a estimativa de liberar mosquitos durante 26 semanas, em torno de seis meses. A nossa expectativa é que a gente comece na segunda quinzena de agosto e dure até janeiro ou fevereiro do ano que vem. Não é toda a cidade. São algumas regiões que foram escolhidas pelo Ministério da Saúde, como áreas historicamente mais infestadas, com maior risco de dengue. [Quais bairros?] Centro, em três áreas, Nações, Municípios e Ariribá. A expectativa é que, ao longo desses seis meses, a gente consiga fazer essa troca da população. [Quantos mosquitos?] Aproximadamente 500 mil mosquitos por semana. Parece uma nuvem, mas vai ser um potinho por rua.

A Wolbachia é perigosa para seres humanos ou outros animais?

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Gabriel: Não há nenhum risco. Está mais do que comprovado, a gente não tem a possibilidade de a Wolbachia sair do corpo dos mosquitos. Não tem como a Wolbachia cair na nossa corrente sanguínea e infectar o ser humano. A gente não está eliminando uma espécie, está apenas trocando. O mosquito vai continuar existindo. [Lembrando que o aedes aegypti não é uma espécie do Brasil...] Ele é um alienígena. Ele é africano e não faz parte de nenhuma teia alimentar.

 

"A cada um real investido no método Wolbachia, você tem um retorno de R$ 43 a R$ 549. Não é retorno, porque não é investimento. Você deixa de gastar, você para de internar, para de gastar com medicamento, ter óbito..."

 

O que se espera que aconteça entre os mosquitos com e sem Wolbachia?

Gabriel: O mosquito da localidade não tem Wolbachia. Se ele cruza com o mosquito que a gente solta, os filhotes nascem com Wolbachia. Gerações de mosquitos acontecem de 15 dias a um mês. O tempo de vida é muito curto. O mosquito vive 15 dias no máximo. Eles vão se reproduzindo, vão se trocando mesmo. A probabilidade de ter um casamento de mosquito que gere filhote com Wolbachia é muito grande. [São só fêmeas ou machos que serão soltos em BC? O macho não transmite...] A gente solta macho e fêmea por dois motivos. Vamos imaginar os possíveis casamentos de mosquitos: se os dois não têm Wolbachia, obviamente, nascem filhotes sem Wolbachia. Se só a fêmea tem Wolbachia, ela tem filhote com Wolbachia. Ou seja: a fêmea com Wolbachia, independentemente do macho que ela cruzar, vai ter filhote com Wolbachia. A gente solta macho com Wolbachia, porque se ele cruzar com uma fêmea sem Wolbachia, ela bota ovo e o ovo não eclode. Incompatibilidade citoplasmática é o nome científico; é um efeito que a Wolbachia gera e garante a eficiência do método. Ele impede que a fêmea, que transmite doença, se reproduza.

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Existe algum risco de os mosquitos perderem a Wolbachia com o tempo?

Gabriel: Não tem. A gente tem essa pergunta no nosso subconsciente constantemente, na parte científica, porque seria uma possibilidade, mas nunca foi encontrado um indício para isso. As colônias que têm Wolbachia foram criadas em 2009 e até hoje estão com 100% de Wolbachia. A gente chama de transmissão materna perfeita. 

 

"A gente está com a estimativa de liberar mosquitos durante 26 semanas, em torno de seis meses"

 

Há uma campanha de desinformação sobre o método dizendo que ele pode causar uma epidemia igual a de covid. A que vocês atribuem e como respondem a essas fake news?

Gabriel: Dúvidas são sempre pertinentes. Todo mundo aprende com dúvidas. A desinformação é um pouco além disso. São inverdades, são informações que não batem com o que está sendo publicado. Entra lá: Wolbito do Brasil, WMB, vamos pesquisar e entender. Esse é o primeiro ponto. O segundo é que a campanha vem acontecendo desde maio nessas três cidades. Nós treinamos o pessoal da prefeitura para eles divulgarem. Agora a gente está fazendo um intensivão mesmo, porque as liberações devem começar no mês que vem. [Como você observa as fake news de que a wolbachia pode contribuir para uma nova epidemia parecida com a de covid?] A gente tem estoques de vacina de dengue que não foi aplicada por medo. Isso tudo vai contra a saúde pública. A desinformação tem um efeito, no final, que são pessoas adoecendo e morrendo.

A comunidade de Balneário Camboriú já entendeu a importância de fazer parte desse método?

Gabriel: A gente fez um acordo com o Ministério da Saúde de seguir um modelo de aceitação pública. Ele obriga a fazer por protocolo. A gente não solta mosquito sem aprovação popular. Para ter aprovação popular, a gente precisa fazer ações de conscientização. Para ter conscientização, a gente tem que fazer treinamento de agentes de saúde. São meses para ter a população participante. Esse período da participação popular culmina num momento de pesquisa de opinião, que aconteceu semana passada nessas três cidades. É uma pesquisa independente que é feita, muitos questionários foram aplicados nas três cidades, com várias perguntas diferentes, e o que a gente viu nesse questionário? Mais de 90% de aceitação do método; mais de 60% de conhecimento.

 

"A desinformação tem um poder destrutivo muito grande"

 

Esse programa é uma política pública do governo federal? E como as cidades são escolhidas para receber esse método?

Gabriel: Esse método existe no Brasil desde 2012. Nós já passamos por alguns governos e sempre tivemos apoio do governo federal. O financiamento é do Ministério da Saúde. O Ministério da Saúde investe na Fiocruz, a Fiocruz investe na Wolbito do Brasil para a produção dos mosquitos com Wolbachia. É um processo de política pública. A seleção é feita pelo Ministério. Anualmente, até semestralmente, eles fazem análises nos mais de cinco mil municípios do Brasil, olhando séries históricas das doenças e fazendo um ranking de cidades que são importantes naquele momento para a transmissão de dengue, porque chikungunya e zika estão um pouco brandas. Tem mais de 100 cidades batendo à porta, querendo o método Wolbachia.

Tem alguma previsão de outras cidades de Santa Catarina receberem esse método neste ano?

Gabriel: Não recebemos a lista do Ministério para o segundo semestre. Não é um método caro. Eu não sei dizer o valor porque isso vem do Ministério da Saúde, mas se a gente pega o quanto é gasto em outros métodos, como inseticida, é barato, porque é um investimento sustentável. A gente tem uma conta que foi feita pela Universidade de Brasília: eles selecionaram sete cidades no país, de diferentes portes, tem São Paulo, tem Campo Grande... Eles fizeram uma modelagem: a cada um real investido no método Wolbachia, você tem um retorno de R$ 43 a R$ 549. Não é retorno, porque não é investimento. Você deixa de gastar, você para de internar, para de gastar com medicamento, ter óbito, absenteísmo das pessoas que não conseguem trabalhar.

 

"A gente não solta mosquito sem aprovação popular"

 

Como é feito o monitoramento, a verificação se está funcionando?

Gabriel: A partir do segundo mês que a gente está liberando os mosquitos, começa a monitorar os mosquitos usando as ovitrampas do município. Ovitrampa é um potinho de planta, dentro vai um pouquinho de água, uns 300 a 400 ml de água, e vai uma palheta de madeira de eucatex, inclinadinha, com uma parte rugosa para fora. A fêmea do aedes aegypti acha que aquilo é um criadouro e bota os ovos. Aquilo vira a nossa amostra. A gente tem mapas que são gerados e mostram a região que precisa de mais um pouco.

Como foi a experiência do método em Joinville?

Gabriel: Joinville ensinou muito pra gente, mas foi desafiador. A gente teve que mudar a logística por vários momentos durante a semana, principalmente por conta da chuva. Pegamos dias muito frios, dias muito quentes. Mas funcionou muito bem. O pessoal da Prefeitura de Joinville comentou que está em mais de 90% de mosquitos com Wolbachia. Eles estão reportando essas reduções impressionantes de casos. Eles tiveram muitos problemas, com mais de 80 mil casos, muitas mortes e agora não estão tendo mais. A gente está muito satisfeito com os resultados.






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