O sistema de controle sobre o dinheiro público é diversificado, com sobrecarga de etapas e instâncias. Tribunal de Contas, Controle Interno dos órgãos, Ministério Público, Portal de Transparência, Observatórios Sociais, Parlamentos [Câmaras]. Todo o sistema parece nascer de um mesmo ponto: a desconfiança, o pressuposto de que há impulsos à corrupção. E os escândalos parecem comprovar a ideia geral de que a “política é coisa suja”.
A fiscalização, muitas vezes, se disfarça de perseguição. A “oposição” a um governante inspira o desejo de encontrar falhas, desvios, descontroles que possam fornecer montantes políticos de acusações administrativas e desmoralização política. Em boa parte das vezes, o enfrentamento “oposicionista”, como mimetismo de camaleão, usa do resultado da acusação para afirmar a defesa da ética e de proteção às pessoas. Este fato é importante porque as pessoas se sentem protegidas contra o “mal público”. Também, na maioria das vezes, o fator que impulsiona a fiscalização é a necessidade de expor a luta política em torno do poder. Quando sentada no Poder Executivo, a outrora oposição passa a ser alvo do mesmo mimetismo político. Como insetos em volta da lâmpada!
Tudo isso porque em nossa Cultura Política “O que é público não é de ninguém”. Ruas, jogar lixo na rua, cuidados com patrimônio público... tudo isso parece ser responsabilidade de outros. Manutenção de limpeza para a não proliferação do mosquito da dengue, os cuidados com o esgoto, as formas de economia de água... tendem a ser “consagradas” se houver algum tipo de punição moral ou financeira privada. Não é pelo caráter público de sua ocorrência, mas pelos custos privados de sua execução.
Fatores como estes vão colonizando nosso ímpeto de cidadania, tão pequeno quanto um vírus, tão danoso quanto seus efeitos. Como causa de nossa forma de observar e viver a Política, o dinheiro público precisa ser vigiado como fosse ouro maligno a impulsionar a ganância incontrolável do humano. Há quase aclamação de multidão, sentimentos comuns de exorcismo, quando um gestor é afastado ou punido por órgãos de fiscalização ou de justiça. Tudo porque aprendemos que a “política é coisa suja” e que “O que é público não é de ninguém”.
Não tendo um proprietário único, o dinheiro público não poderia ser requerido por ninguém em especial. Reservado aos “cofres públicos” [e não a um proprietário], fica depositado para ser usado por um gestor público. E por mais que este gestor possa observar todos os rigores administrativos, processuais e jurídicos, os olhos de águia sempre vão procurar os percalços. E devem fazê-lo, não por lutas políticas [ao mudar de lugar tudo se repete], não por tentativa de desmoralização moral, mas porque o público tem a cara de todos! Caso contrário, mudando os postos, se e quando a “oposição” assumir o poder, tudo se repetirá como farsa política e tragédia social.
Mas a Política ainda tem a reserva de ser o pontifício da esperança. A cada eleição há possibilidades de mudanças e, talvez, de transformação. Mudar, por vezes o nome do gestor, não parece ter resolvido nossos problemas políticos e sociais. Transformar implica em modificar comportamentos, impulsionar o diferente moral, a distinção ética. O voto, ato individual, é uma resposta de responsabilidade coletiva. O voto é um dos caminhos para transformar. Mudar tem se demonstrado pouco!