Coluna Exitus na Política
Por Sérgio Saturnino Januário - pesquisa@exituscp.com.br
Mamãe eu quero
Todo o ser nasce egoísta. É da natureza de ser do humano. No nascimento, o primeiro ato de autopreservação é a amamentação. E logo depois, para cada necessidade requerida, um sinal de busca. Chegamos a conseguir interpretar o choro de um bebê por fome, por higiene, por sono. Somos assim na origem: seres dependentes. Por depender de outros, o instinto carrega o impulso da inquietação, genuína, em busca de conforto de vida.
A partir da interiorização dos valores e regras sociais a criança crescida passa a apresentar formas lancinantes [como fisgadas internas] de uma luta dolorosa. A guerra, infinita, entre os desejos de egoísmo primitivo e as relações com o mundo exterior que lhe cerca em cada instante de sua respiração é um duro aprendizado social. Uma das expressões dessa guerra, sempre inacabada, se manifesta em manhas e birras. A reação à vontade contrariada, ao poder irascível, à exaltação do querer íntimo frente à negação dos desejos revela o quanto o mundo se projeta a referências do próprio “eu” [ego] tomado como o centro original da vida.
O tempo se vai e o amadurecimento social exige a conquista das relações sociais, da inclusão dos outros frente aos anseios mais egocêntricos e personalistas. Adultos mal formados nessa trajetória tendem a ser agressivos e violentos, a consignarem outros culpados para suas próprias falhas de relacionamentos sociais, e a criarem justificativas e verdades que só servem para embalar o choro da criança que resiste dentro de si. Os cargos de poder, controle e gerência dão fluxo a muitas manifestações de vaidades, arrogâncias e temperamentos explosivos.
A correção de tudo isso são, em parte, assimiladas por efeitos de regras sociais, valores morais e determinações da ética. As relações sociais e todos os seus valores entram no corpo do ser, penetram a corrente sanguínea e procuram orientar os passos da caminhada. É uma luta eterna entre o desejo pessoal e a vida social, entre minha vontade e as relações sociais, entre o ego e os outros que vivem a me olhar como vigilantes morais. O ego, em parte, se retrai.
Os que estão em postos de poder [público ou privado] podem colocar o ego a frente das regras de relacionamento, impor suas vontades ou dissimular sua formação irresistível do personalismo. Assim, protegem seu ego do mundo que lhe cerca. Criam um mundo próprio, inalcançável aos outros. Outros que lhe são subordinados, subjacentes aos seus interesses. Assim, criam estruturas sociais e ferramentas pessoais para enfrentar um mundo que lhe cerca.
A política tem servido, ao menos no caso brasileiro, como forma de manter os interesses próprios, particulares, frente a incumbência, por regra e responsabilidade pública, de exercerem a representação dos interesses coletivos. Criam regras, leis, regimentos como proteção pessoal; geram leis que confundem a punição com liberalidade. São parteiros de infortúnios sociais, da fome estomacal, da miséria espiritual. Usam dos recursos públicos na guerra, infinita, entre os seus desejos de egoísmo primitivo. Orçamentos secretos, verbas de gabinetes, auxílios de todas as ordens e jeitos, salários sem teto, poder sem limite.
Os políticos que elegemos parecem viver com fraldas. Fornecem suas próprias vontades, definem seus próprios interesses, formam suas próprias regras. Olham tanto para dentro de si que não sabem caminhar no cotidiano das ruas sem seguranças para protegerem seus egos.
A responsabilidades dos eleitores, como pais responsáveis pela vida do filho-país, é estabelecer as regras de convivência, e não permitir que as crianças, originalmente egoístas, formem as normas de relacionamentos sociais por seus interesses personalistas.
Estamos formando muito mal os políticos que nos governam. Como eleitores, somos pais covardes que preferem o sorriso da conquista egoísta dos filhos, evitando as birras e os desconfortos da guerra entre ego e a vida social. Com o voto impulsivo, deformamos o coletivo e ficamos presos aos deleites das frações do personalismo político. O voto, como a educação dos filhos, tem responsabilidade pública, tem efeito sobre os outros.