O projeto tem gerado polêmica porque, na prática, poderia levar à privatização das praias e afetar áreas de proteção ambiental na zona costeira. Em Barra Velha, a denúncia expõe que a flexibilização da lei pra ocupar as chamadas terras de marinha – faixa do continente de 33 metros a partir da linha média das marés – já começou, mesmo que a PEC ainda não tenha avançado no Senado.
O morador relata que a mudança foi feita no último mês de abril, com a sanção da lei complementar 317 pelo prefeito interino Daniel Pontes da Cunha (PSD). O denunciante diz que a nova lei altera a exigência de autorização da Secretaria de Patrimônio da União (SPU) para construções em área de marinha, apesar de não ter aprovações sobre o tema no Senado.
A lei complementar 327, de 10 de abril de 2024, altera um dos artigos do Código de Obras do município. Com a mudança, o inciso l, do artigo 42, da lei complementar 68, de 12 de dezembro de 2008, foi atualizado. O morador diz que a alteração abriria brecha pra construções em áreas de marinha no município.
O texto original proibia a concessão de licença para construção, entre outros casos, “em terrenos de Marinha ou sujeitos ao seu interesse e cuja situação legal a esse respeito não esteja comprovadamente regularizada”.
Agora, a redação traz a proibição “em terrenos de Marinha declarados pela União como de seu interesse”. A preocupação é que licenças de construção poderiam ser liberadas pra áreas que eventualmente não tiveram declaração de interesse pela União, dispensando exigências de liberação pela SPU.
Para o morador, a lei que alterou o Código de Obras seria inconstitucional, visto que a “PEC das Praias” (PEC 03/22), sobre possíveis mudanças no regime de propriedade em áreas de marinha, ainda está em discussão no âmbito federal e que cabe à Secretaria de Patrimônio da União (SPU) a gestão desses terrenos.
Ele lembrou que a nova lei chega no meio de um governo de transição, após a prisão do prefeito Douglas Elias da Costa (PL), investigado por suposto esquema de corrupção em obras, junto com secretários e empresários.
“Nosso prefeito e secretários presos, mas parece que a classe política não aprende nada. Inclusive essa lei em Barra Velha mostra bem o que está em jogo com esta PEC, o que ocorrerá quando se der esse poder aos municípios”, comentou. Ele ainda relatou que a mudança na lei foi descoberta por membros do Comitê Gestor do Projeto Orla em Barra Velha, após denúncia de suposta construção irregular em área de marinha.
A prefeitura ainda não se manifestou sobre o assunto.
PEC passará por novos debates no Senado
No Senado, a “PEC das Praias” já passou por audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça em 27 de maio. O debate dividiu senadores e especialistas, além de ter ganhado repercussão nas redes sociais com um embate entre a atriz Luana Piovani, que se manifestou contra a proposta, e o jogador Neymar, favorável à mudança.
Na semana passada, o Senado aprovou um requerimento pra realização de debates temáticos sobre a PEC. Após a repercussão de que o texto permitiria a privatização de praias, mudanças já são discutidas pra proposta avançar. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), descarta votar rapidamente a PEC, dizendo que o tema será amplamente discutido antes de ir ao plenário.
O projeto autoriza a União a vender as terrenos de marinha que incluem também margens de lagoas e rios sob influência de maré. As áreas também poderiam ser transferidas para a gestão dos estados e prefeituras. O governo federal, por meio do Ministério da Gestão e Inovação, afirma que a PEC dificulta o acesso às praias e favorece a especulação imobiliária.