Colunas


Carnaval 2014


Finalmente chegou a quarta-feira de cinzas. Como sempre acontece durante o carnaval, tudo virou de cabeça para baixo, o que era sólido se desfez no ar e passou por decurso de prazo. O que estava em vigor perdeu a validade, como por encanto, em meio ao desvario.

Vocês, caros leitores, talvez não tenham percebido, ou porque estavam mergulhados na folia ou porque tiraram o feriadão para descansar e não leram jornal nem viram televisão ou, ainda, porque estavam – e graças a Deus que ainda existem pessoas que fazem isso – em retiro espiritual, se penitenciando dos próprios pecados e dos pecados do mundo.

Mas a verdade é que, durante o reinado de Momo, o cavalo da estátua equestre desceu do pedestal, deixando o general lá em cima, com as pernas arqueadas e a cara de poucos amigos, porque isso não se faz com um oficial da cavalaria.

O mestre-sala e a porta-bandeira fizeram uma operação tartaruga durante o desfile, dançando em câmara (ou seria câmera?) lenta, o que facilitou muito o trabalho dos cinegrafistas, os quais puderam registrar em “close” cada detalhe das evoluções.

O diabo em pessoa ocupou uma rede de rádio e televisão, fazendo proselitismo de uma vida saudável, calma e tranquila, e apelando aos foliões para que segurassem um pouco a barra da luxúria e da bebida, ao menos nos três dias de carnaval. Ele reconheceu a existência de Deus e afirmou, com todas as letras, que apesar das divergências, tem por Ele grande respeito, classificando-O como “um adversário à altura”.

Os black bocs fizeram demonstrações pacíficas nas ruas das grandes cidades, desta vez sem máscara no rosto. Vestiam terno e gravata. Os únicos artefatos que portavam eram canetas esferográficas, para colher assinaturas de foliões e transeuntes, em favor da paz nos estádios e da interdição das torcidas organizadas.

O político e ecologista Al Gore escreveu artigo no “New York Times”, onde prova em definitivo a ocorrência do aquecimento global. O fenômeno, contudo, segundo Gore, está todo concentrado no Sul do Brasil, mais especificamente em Porto Alegre, como deu para ver (e sentir) nos 40 graus à sombra, de janeiro e fevereiro.

Deputados e senadores fizeram um esforço concentrado em Brasília. Nos três dias de carnaval, deixaram as tramoias de lado e se ocuparam exclusivamente de assuntos de relevância, do maior interesse para o país e o povo. Tomaram a decisão de dar fim ao programa radiofônico “A Voz do Brasil”. Empolgados nas boas intenções, apesar da pouca prática de fazer o bem, deliberaram acabar com o horário político gratuito. A consequência feliz desses atos históricos será a diminuição considerável da chatice e da produção de factoides no rádio e televisão brasileiros.

Esses – e outros – acontecimentos insólitos só acontecem no carnaval. Surgem do nada, mas na quarta-feira de cinzas se dissipam, e como um bêbado que cura o porre, tudo volta ao normal. Uma pena, porque estava começando a ficar interessante.

* Tito Guarniere é advogado e jornalista. Trabalhou no jornal O Estado de São Paulo. Foi colunista dos jornais O Estado (Florianópolis), A Notícia (Joinville) e do Terra Magazine.


Conteúdo Patrocinado


Comentários:

Deixe um comentário:

Somente usuários cadastrados podem postar comentários.

Para fazer seu cadastro, clique aqui.

Se você já é cadastrado, faça login para comentar.

ENQUETE

O que você achou do corte do banho e da comida a moradores de rua?



Hoje nas bancas

Confira a capa de hoje
Folheie o jornal aqui ❯


Especiais

Verde-amarelo em disputa e pautas "invertidas" marcam 7/9 antes de julgamento de Bolsonaro

SETE DE SETEMBRO

Verde-amarelo em disputa e pautas "invertidas" marcam 7/9 antes de julgamento de Bolsonaro

Malafaia usa Bíblia para transformar investigação em provação divina

Nos cultos

Malafaia usa Bíblia para transformar investigação em provação divina

Guerra no Congo e o silêncio da comunidade internacional diante de 10 milhões de mortes

CONFLITO INTERNACIONAL

Guerra no Congo e o silêncio da comunidade internacional diante de 10 milhões de mortes

Como lema da esquerda foi pego por bolsonaristas e virou mote no 7 de setembro

Anistia

Como lema da esquerda foi pego por bolsonaristas e virou mote no 7 de setembro

“Bolsonaro ainda é insubstituível”: antropóloga analisa os rumos da extrema direita

EXTREMA DIREITA

“Bolsonaro ainda é insubstituível”: antropóloga analisa os rumos da extrema direita



Colunistas

Pastora Paula carcou processo

JotaCê

Pastora Paula carcou processo

Câncer na infância

Coluna Esplanada

Câncer na infância

TCE/SC intensifica fiscalização de obras

Coluna Acontece SC

TCE/SC intensifica fiscalização de obras

Porquinhos-da-índia na restinga da Praia Brava em Itajaí

Charge do Dia

Porquinhos-da-índia na restinga da Praia Brava em Itajaí

Rolê na Europa

Coluna do Ton

Rolê na Europa




Blogs

🌻 Setembro Amarelo – Mês de Valorização da Vida

Espaço Saúde

🌻 Setembro Amarelo – Mês de Valorização da Vida

Alimentação no setembro amarelo

Blog da Ale Françoise

Alimentação no setembro amarelo

Fashion week aqui

Blog da Jackie

Fashion week aqui

MP pede cabeça de secretário

Blog do JC

MP pede cabeça de secretário



Podcasts

Floração de ipês cria espetáculo pelas ruas

Floração de ipês cria espetáculo pelas ruas

Publicado 11/09/2025 20:06





Jornal Diarinho ©2025 - Todos os direitos reservados.