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Corrupção
Até bem pouco tempo atrás a corrupção era um mal em si. Ninguém conceituava sobre o seu significado, relevava ou justificava. Ninguém perdoava nem dava colher de chá. A corrupção era abominada, os corruptos eram expostos à execração pública, e ponto final.
Se havia um fascínio dos primórdios do PT era a tolerância zero contra a corrupção. Os petistas, Lula à frente, apareciam de cara feia e testa franzida, para denunciar as maracutaias, como eles adoravam chamar. Dava gosto de ver. Parecia que, finalmente, havia chegado uma força política com disposição de pôr fim à roubalheira, praticada regularmente no Brasil desde o descobrimento, e que chegava impávida, quase intocável aos nossos dias. Era natural que um partido assim decidido, com tal bandeira desfraldada, atraísse a simpatia de milhões de brasileiros, cansados da tramoia geral.
Com a vitória do PT em 2002 a corrupção ganhou um novo sentido, começou a ser vista sob uma nova ótica e uma nova ética. A corrupção não deixou de ser um ato de delinquência, mas em termos. O conceito flexionou e relativizou-se. Primeiro negava-se a roubalheira. Depois, diminuía-se o tamanho do assalto: o prejuízo não era tão grande quanto calculava a oposição e a imprensa golpista.
No mensalão, meio a contragosto, se reconhecia o rombo de milhões, porém era desvio de conduta individual, de alguns ingênuos - como José Genoíno, que não sabia o que havia assinado. Ou admitia-se a ocorrência da malfeitoria, porém o todo não poderia ser contaminado pela minoria descuidada. E, claro, Lula (ou Dilma, depois) não sabiam de nada.
Também se usava a desculpa cínica de que todos fazem. Os tucanos faziam, mas escondiam a sujeira embaixo do tapete - dizia-se. Em 12 anos de governo, o PT repetiu à exaustão o discurso da roubalheira no tempo de FHC, mas não moveu uma palha para prová-la ou levar os culpados ao banco dos réus. A discurseira (e não a ação) contra a corrupção dava menos trabalho e era eleitoralmente mais eficaz.
E na mais descarada das justificativas, enunciada em voz quase inaudível, envergonhada, diz-se que os rombos são, entretanto, cometidos por um governo que cuida dos pobres, que faz justiça social e distribuição da renda. Não importa, pois, que tenha havido roubo na Petrobras, no Banco do Brasil, no governo. Trata-se de corrupção do bem, virtuosa, que deve ser relevada e perdoada.
É a causa, portanto, que preside a ética e não o inverso. O bem que se persegue justifica desvios, lambanças, incursões predatórias nos cofres do erário. Como os fins são nobres e justos, então façamos vista grossa com a ilicitude dos meios. A ética que vige, impoluta e sobranceira, é a de que os fins justificam os meios.
Reforma política - que volta à cena - é conversa fiada para ganhar tempo. Ninguém vencerá a pouca vergonha atenuando e tornando aceitável, em nome de propósitos virtuosos, o roubo ainda mais de dinheiro público.
Não é para ajudar os pobres que roubam, mas para se perpetuar no poder.