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Escrever é desnudar-se
Quem escreve semanalmente para um jornal, ou mesmo rabisca um diário relatando seus mais íntimos sentimentos, impressões, frustrações, ideias, é, em regra, uma pessoa que não teme olhar para si, mostrar-se a si mesmo e aos outros.
É bem verdade que, no caso de um diário, o desnudar-se ocorre em frente ao espelho, no recôndito do quarto, ao contrário de quando se escreve para um veículo de comunicação, em que se tira a roupa em praça pública.
Sempre que inicio as linhas desta coluna, retiro de mim os meus mais íntimos sentimentos e personagens. Embora às vezes as narrativas não sejam tão fidedignas aos acontecimentos (o que é próprio das escritas), elas sempre acabam por entregar uma peça de tecido que cobre o meu corpo a cada leitor, um pouco do novelo de experiências que enrolei nesses 32 anos de vida.
É assim porque cada personagem, local, momento e movimento que redijo acabam desnudando algo de minha intimidade. E não tem como ser diferente, pois o autor, nesta relação com o leitor, num dia tira o casaco, em outro tira o boné ou o moletom, até que, decorrido certo tempo, o leitor acaba sabendo do autor tanto quanto este próprio sabe de si mesmo, ainda que os dois nunca tenham se encontrado.
Isso ocorre comigo, na condição de leitor. De tanto ler alguns colunistas, tenho a impressão de conhecê-los como velhos amigos. Não temo, inclusive, fazer análises deles a partir do que interpreto em seus textos. E afirmo, sem medo de errar, que talvez eu os conheça mais do que muitas pessoas que vivem próximas a eles, apenas observando as roupas que espalham, por intermédio de seus textos, na frente dos leitores.
Ainda que o autor escreva na terceira pessoa, ele acaba por falar de si, pois interpreta o mundo externo de acordo com os próprios olhos, a própria história. E esse interpretar nunca é isento. Pelo contrário, pois vem carregado de uma vivência que condiciona as regras sobre como o objeto deve ser visto e interpretado.
Por isso, em cada linha que escreve, em cada momento de transposição do imaginário para o papel, o autor faz muito mais do que simplesmente redigir. Ele cria um vínculo forte com seu leitor, tão intenso que acaba por lhe revelar suas intimidades, como se estivesse nu à sua frente, sem nenhum tipo de pudor.