RELIGIÃO x POLÍTICA

Sete em cada dez vereadoras eleitas nas capitais brasileiras são cristãs

Levantamento inédito do Iser mostra predominância de católicas e evangélicas nas câmaras municipais

Foto: Renan Olaz/CMRJ
Foto: Renan Olaz/CMRJ

Por Danilo Queiroz | Edição: Mariama Correia

A vereadora reeleita no Rio de Janeiro, Joyce Trindade (PSD), é evangélica e frequenta a Igreja Batista. Ela diz que a religião teve influência na sua reeleição, mas não somente isso. “Sou mulher, preta, vim da periferia e fui estudante de universidade pública, não dá para me reduzir somente à minha religião”, completa.

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Trindade está entre as vereadoras cristãs eleitas para assumir o mandato entre 2025 e 2028. Elas são maioria nas câmaras municipais das capitais brasileiras, segundo pesquisa do Instituto de Estudos da Religião (Iser). Sete em cada dez vereadoras eleitas nas capitais brasileiras são cristãs, de acordo com o levantamento, que mapeou a identidade religiosa das eleitas, ao qual a Agência Pública teve acesso com exclusividade.

Dos 840 parlamentares eleitos nas capitais, 179 são mulheres. Dessas, quase 70%, 125 do total, são cristãs, sendo 55 católicas, 47 evangélicas e 23 de identidade cristã não determinada.

Há ainda 16 afroreligiosas, três espíritas, uma judia – a vereadora de Porto Alegre Fernanda Barth (PL) – e uma de espiritualidade indígena – a vereadora de Florianopólis Ingrid Mawé (PSOL). Três vereadoras foram identificadas como afrocatólicas, por se autodefinirem com duplo pertencimento religioso. A metodologia leva em consideração a autoidentificação (nome de urna, redes sociais) e a heteroidentificação, que se relaciona com o discurso ou fotos em comunidades religiosas durante as campanhas.

Por que isso importa?

  • Levantamento inédito mostra que quase 70% das vereadoras eleitas em capitais brasileiras são cristãs;
  • Entre as evangélicas, maioria é vinculada a igrejas pentecostais e a partidos de direita

Entre as evangélicas, 29 são de igrejas pentecostais (61,7%), sendo a maior parte das Assembleias de Deus (10) e da Igreja Universal do Reino de Deus (7).

Quando se cruza dados de religião com raça, as vereadoras cristãs são predominantemente mais brancas, 55,86% frente a 43% negras. As católicas são as mais brancas (33), e as evangélicas se distribuem entre brancas (27) e negras (22). Das 16 afrorreligiosas, dez são negras, assim como as três afrocatólicas. Todas as espíritas são brancas.

Quanto à vinculação partidária, de acordo com o Iser, o PT e o PSOL são os partidos com maior número de mulheres eleitas no país, 23 e 22, respectivamente. Mesmo assim, a pesquisa mostra um predomínio dos partidos de direita nas vinculações: 45,13% vereadoras são de partidos de direita, 37,43% da esquerda e 15,64% do centro. “As evangélicas estão mais vinculadas a partidos de direita, as católicas se dividem entre direita e esquerda, e as afrorreligiosas são predominantemente de esquerda, com menor participação ao centro e nenhuma de partidos de direita”, diz o estudo.

De acordo com a pesquisadora do Iser Magali Cunha, o cenário acompanha as tendências observadas em candidaturas com identidade religiosa nas eleições anteriores de 2020 e 2022. “Houve um crescimento dessa categoria cristã não especificada, que nem se diz católica ou evangélica. Ao que nos parece, é uma estratégia que avança a cada eleição, numa tentativa clara de alargar o apoio do eleitorado, sem polarizar para nenhum dos lados”, explica.

O estudo do Iser mostra que a Câmara Municipal de São Paulo é a com maior quantidade de mulheres eleitas entre as capitais brasileiras, são 20 parlamentares dos 55 vereadores. Destas, 11 são cristãs, sendo sete evangélicas e quatro católicas. Ainda há uma afrorreligiosa, uma espírita e sete não identificadas.

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Curitiba, Belo Horizonte e Rio de Janeiro dividem o segundo lugar com 12 vereadoras em cada. No Rio, destas, sete vereadoras são cristãs, duas afrorreligiosas, uma espírita e duas não identificadas.

Intolerância religiosa

Joyce Trindade foi eleita para a Câmara de Vereadores do Rio, assim como Thais Ferreira (PSOL). “Sou filha de Oxum com Xangô, e isso atravessa não só a minha vida, mas também o meu mandato”, disse Thais, que é candomblecista.

Por assumir uma posição religiosa mais explícita no seu mandato, em defesa das casas de matriz africana como espaços de cuidado e promoção da saúde, ela tem vivido episódios de intimidação dentro da Câmara por outros vereadores.

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Vereadora das capitais cristãs, mulher negra de cabelo black power volumoso, fala ao microfone em um ambiente de debate ou conferência. Ela veste blusa preta rendada, brincos prateados e usa um broche com os dizeres "Preto é lindo". Há um copo d’água à sua frente e outras pessoas parcialmente visíveis ao redor.
Vereadora Thais Ferreira em sessão na Câmara dos Vereadores (Foto: Eduardo Barreto / CMRJ)

Atualmente, a vereadora protocolou um Projeto de Lei que institui a política municipal de combate ao racismo ambiental, em que cita as comunidades de terreiro como vítimas desse tipo de violação. Além disso, ela tem articulado com lideranças de terreiros, especialmente nas regiões mais afetadas pela intolerância religiosa. De acordo com a central da Prefeitura do Rio de Janeiro que recebe relatos e denúncias enviadas pela população, no ano passado, a Zona Norte teve 21 denúncias de ataques a terreiros. Em segundo lugar, a Zona Oeste do Rio recebeu 15 denúncias.

Neste ano, nas redes sociais, a vereadora Joyce Trindade, que é evangélica, também recebeu diversas críticas por prestar homenagem à orixá feminina Iemanjá. “Eu perdi muitos seguidores com essa foto, mas se eu perco de um lado, ganho de outro, acabo sendo visto como uma evangélica mais aberta, me favorece”, disse à reportagem.

Publicação na rede social da vereadora Joyce Trindade em homenagem a Iemanjá – Crédito: Reprodução Instagram

Mulheres evangélicas na política

Assembleiana do Ministério Madureira e filha de pastores, a vereadora de Goiânia Aava Santiago (PSDB) foi reeleita neste ano como a quarta parlamentar mais votada entre os 37 vereadores empossados. Entre os parlamentares, apenas cinco são mulheres. Somente Aava e a vereadora Léia Klebia (PODE) foram reeleitas. “É como se internamente na política, as mulheres não pudessem avançar em relação ao número de homens na Câmara. Então, para uma ser eleita, uma precisa sair”, diz.

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Vereadora das capitais cristãs com longos cabelos escuros encostada em uma parede amarela, olhando diretamente para a câmera. Ela veste um vestido rosa com estampa floral amarela e está em uma rua com portas de comércio fechadas ao fundo.
Aava Santiago, foi a quarta vereadora mais votada de Goiânia (Foto: Mídia Ninja)

No ano passado, a vereadora foi convidada pela primeira-dama Janja para uma reunião com o presidente Lula (PT) no Palácio do Planalto sobre a rejeição do governo pelo público evangélico. Ela participou da campanha do presidente durante as eleições de 2022.

“Diferentemente de vereadores da Câmara que saíram pedindo bênção de pastor às vésperas da eleição, minha eleição não se deu em defesa exclusiva dos interesses que atravessam minha fé. E isso é bom, me possibilita transitar por diversas pautas com liberdade, Deus me livre ser cobaia de igreja, isso é ir de encontro ao evangelho de Jesus”, disse à Pública.

 






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