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As melhores amigas


“Só há uma criança linda no mundo, e cada mãe a possui.” (J. C. Bridge)

Tirei uns 20 dias de férias agora em março e viajamos, toda a turma de seres vivos de casa – dois adultos, uma criança e dois gatos – para uma praia distante e bastante deserta nesta época do ano. Durante o breve período em que ficamos apenas os da família juntos, pude, pela primeira vez em muito tempo, viver as 24 horas do dia de minha filha sem descanso e nem ajuda, o que significa dizer que passei umas 16 horas fazendo ávidos exercícios físicos de corrida atrás de criança, inventando os maiores malabarismos para dar de comer e escutando todo o tipo de DVD infantil já inventado até hoje. Um paraíso na terra!

Ironias à parte, a verdade é que cuidar de criança não poderia jamais ser considerada uma atividade banal. Fico indignada quando escuto alguém dizer que “fulana não trabalha, não faz nada; apenas fica em casa, cuidando do filho.” Aham: se é tão fácil, vá fazer igual. Aposto que esses hereges nunca na vida ficaram trancados uma tarde inteira com uma criança pequena para cuidar, vigiar, educar e, principalmente, entreter, bater altos papos, dar banho, alimentar, levar ao banheiro ou trocar fraldas – e pior ainda é se o dia é chuvoso.

Fico impressionada com esse pessoal que emenda um filho no outro: como esses pais dormem tranquilos? Como conseguem arranjar tempo para pentear o próprio cabelo, cortar suas unhas ou ir ao banheiro em menos de 15 segundos? Missões mais complexas como fazer qualquer serviço de rua – banco, médico etc. – só são possíveis se houver uma troca de turno com algum outro soldado, ou ficam para depois que as crianças mais novas já estiverem na pré-escola, no mínimo.

Mas, como em tudo na vida, sempre há as compensações, e como são grandes. No meio de um momento “acho que vou pirar”, minha filha do nada vem correndo, bracinhos abertos, e envolve as minhas pernas, dizendo “sabia que eu amo você, mamãe?” Espertinha ela; sabe, com dois anos, que meu coração é um frouxo, mesmo, nunca resiste a uma declaração desse tipo.

Há ainda as situações hilariamente embaraçosas que ela me fez passar, como quando, no meio de um restaurante, anunciou solenemente a todos os presentes que precisava fazer cocô, e depois de sair do banheiro, voltou correndo, feliz da vida, gritando para os que ficaram à mesa e todas as outras criaturas ouvintes o quanto tinha sido bem sucedida. Ou então, desde que descobriu os meus batons e pinceis de maquiagem, como faz questão de sair à rua devidamente produzida e se recusa a falar ou a comer qualquer coisa quando está com a boca pintada, “para o batom não sair”.

Não tem preço levar um filho à beira-mar quando ele já tem idade para entender onde está e ver em seu rostinho o deslumbramento de experimentar pôr os pés na água, ou rolar na areia até só se enxergarem seus olhos. Nadar abraçadinhos, comprar-lhe um ou vários picolés que mais vão escorrer entre os dedos do que serem consumidos, deixar que a criança corra, que se gaste na praia e, no fim do dia, observar seu sono cansado e satisfeito, a pele levemente tostadinha do sol, o ar de saúde, a vida pulsando lá dentro; é isso que faz a existência valer a pena.

Minhas férias terminaram, estou exausta, mas feliz. Parece que nesses dias em que xifopagamos, eu e ela, minha filha amadureceu mais, cresceu, ficou mais adultinha. Nada precoce nem preocupante, só milagroso. Foi um tempo muito bom para mim: redescobri meus talentos da cantora, fotógrafa, atriz e animadora infantil. Voltei a brincar de boneca, a rir dos episódios do Chaves, lembrei dos meus tempos de fã de Xuxa – condição transmitida cromossomicamente à cria –, resgatei as brincadeiras com baldinho e pazinha na areia. Ao final, me dei conta de que minha filha é a minha mais nova amiga de infância.

Comentários, críticas e sugestões para daianabfranco@gmail.com


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