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Enroladores


“Em qualquer momento de decisão, a melhor coisa a ser feita é a certa; a outra melhor coisa a ser feita é a errada; a pior coisa a ser feita é NADA.” (Teddy Roosevelt)

Adoro ler, mas detesto livros de autoajuda. Acho todos umas falácias, propagandas enganosas de mudanças impossíveis de praticar. Tratam de assuntos escabrosíssimos – do tipo como ser eficaz em sete lições ou como se tornar um milionário em um clique – como se fossem banais, corriqueiros; quase uma conversa entre comadres. Fazem com que eu me sinta idiota e incompetente por não ser capaz de por em prática as ideias, sempre muito simples (como ninguém pensou nisso antes?) mas capotantes, de conquistar todos os meus sonhos, de ser uma sujeita próspera, de muito sucesso, inesquecível, incomparável.

Por essas e por outras é que passo batido pelas prateleiras de livros desse naipe. Fora a vergonha de encarar o caixa em uma livraria, com um exemplar de “Como ter milhões de amigos e ser idolatrado por todos” debaixo do braço: terapia na veia para ontem, já, urgentemente.

No entanto, arrumando os meus livros em casa, encontrei um exemplar que certamente não fora comprado por mim e que se chama “Não deixe para depois o que você pode fazer agora”– título mais do que sugestivo e provocativo para uma criatura como eu, enrolona e enrolada por natureza. Desnecessário reforçar o meu descrédito com as promessas paradisíacas da contracapa: “não adie a leitura deste livro: é o primeiro passo para vencer suas dificuldades e mudar radicalmente sua vida”. Frases de efeito como essa significam tanto para mim quanto uma partida de futebol entre o Brasil de Pelotas e o Ibis. Aliás, incentivos desse tipo provocam resultado oposto em pessoas como eu: quanto mais apoteóticas as juras de uma guinada de 180 graus em todos os cacoetes e maus hábitos, mais ateia e cética me torno.

Mais até por deboche, temperado com um quê de curiosidade, dei aquela espiada básica e enviesada no livro. Passei os olhos pelo sumário, contei quantas folhas tinha no total (são poucas, algo mais que cem páginas, quase um guia de bolso). Meio contrariada, disse aos meus botões que faria uma leitura dinâmica, só mesmo para reforçar meu pré-conceito sobre a inutilidade de obras como aquela. Surpreendentemente eu estava enganada: aí está uma leitura obrigatória para todos aqueles que pertencem à fraternidade dos postergadores; bem-vindos, irmãos. Esse livro é uma verdadeira igreja, um templo para cultuar conceitos básicos de sobrevivência como organização e disciplina.

A gente sabe – aliás, todo mundo sabe – que para vencer na vida é preciso garra, motivação e, sobretudo, empenho diário. Mas, se é assim tão fácil, por que 99% da população patina no mesmo lugar há séculos, nunca consegue por seus projetos em prática, adia tarefas, esquece (ou deliberadamente não quer lembrar) de compromissos importantes e ignora problemas até o ponto em que se tornam insolúveis?

Simples, elementar: porque temos medo. Medo de saber a verdade, medo de encarar a realidade, medo de escutar, medo de admitir nossos erros, medo de fracassar, de se incomodar, de parecer burro ou ridículo, de enxergar. Enfim: é pelo medo que vamos empurrando as tralhas da vida com a barriga, fazendo de conta que está tudo bem ou que dá para levar por mais um tempo, até o dia em isso não é mais possível. Nem sequer percebemos o quão desgastante, física e emocionalmente, é o malabarismo de equilibrar problemas em pratos, até o ponto em que perdemos o equilíbrio. Nesse momento, nossas desculpas não só já acabaram com o nosso crédito junto aos outros como destruíram o conceito (já raso e puído) que tínhamos de nós mesmos.

Seja lá qual for o medo, é ele que nos paralisa e faz com que tomemos os atalhos do que é aparentemente mais fácil e entorpecente. Ao invés de ir de uma vez ao médico, de buscar o resultado do exame, de conferir o extrato no banco, de negociar aquela dívida de anos, de entregar o relatório do mês ao chefe, de estudar para um concurso, ao invés de tomar uma atitude a gente vai é tomar um cafezinho, ligar para a mãe, assistir a um filme, acessar a internet, conferir as fotos no facebook dos amigos – se distrair.

As pessoas que importam neste mundo fazem a sua hora, não esperam acontecer. Embora eu não creia especificamente em nada sobrenatural, gostei muito de uma frase citada naquele livro que pretendo memorizar para os momentos mais agudos da minha reabilitação na mania de enrolar: Deus prometeu o perdão pelo seu arrependimento, mas Ele não prometeu o amanhã pela sua protelação. Santo Agostinho, o mentor desse pensamento, era mesmo um visionário.

Comentários, críticas e sugestões para daianabfranco@gmail.com<mailto:daianabfranco@gmail.com>


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